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segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Dois textos para refletir na Semana da Consciência Negra...

A Helena Negra posta “no seu lugar”.

Os dias de glamour da primeira Helena negra foram poucos. No capítulo de ontem, numa cena que fazia uma alusão direta à noção de soberania branca, a personagem negra se ajoelha aos pés da mulher branca e pede perdão. Após isso, dotada de toda autoridade, a “mãe branca e zelosa” dirige um violento tapa na cara na personagem negra que resignadamente aceita a punição. A cena chocou diversas pessoas. No caso particular das mulheres negras, todas se recusaram a se reconhecer daquela forma e se revoltam contra aquela atitude submissa e passiva diante da violência racial. Aquela cena teve uma repercussão desastrosa em cada uma de nós. A postura submissa da Helena negra vai contra a forma como hoje, e sempre, reagimos à violência racial e ao autoritarismo, seja pelo amparo da lei, seja impondo respeito diante daquele ou daquela que insiste em rememorar os tempos da escravidão, cobrando de nós o eterno deferimento e subserviência. Assim, a trama da novela vai contra a política e debates atuais que visam a igualdade de direitos e a postura autônoma que praticamos no nosso cotidiano e ensinamos a nossas jovens e crianças negras. A cena de ontem também vai contra os argumentos daqueles que se negam a admitir a existência do racismo no Brasil, que se afirma no imaginário do autor. O capítulo de ontem, por si só, fala da insistente crueldade da elite brasileira de negar o problema do racismo ao mesmo tempo em que, de maneira nefasta, não abre mão de se manter numa posição privilegiada. . A Helena negra é culpada por ter abortado, por ter casado com um homem branco e por não ter “cuidado” devidamente da enteada, numa relação que muito nos lembra mucama e sinhazinha. Não só Helena, mas também a personagem da atriz Sheron Menezes tem a mesmo postura submissa, que paga (literalmente) um alto preço para estar com um homem branco. Ambas sucumbem diante da supremacia branca retratada na televisão brasileira, ambas não tem dignidade e não representam a luta cotidiana dos homens e mulheres negras que diariamente enfrentam o racismo neste país. Ao que me parece, é muito difícil para a dramaturgia brasileira esconder este ranço ordinário da mentalidade escravocrata e racista.

Luciana Brito
Mestre em História UNICAMP
Movimento Negro Unificado-Bahia"


A Consciência Branca da Globo

Não havia data melhor. Em plena semana da Consciência Negra, a teledramaturgia global reafirma, mais uma vez, a pura reprodução de imagens, palavras e ideais racistas em horário nobre.
Ao elencar a atriz negra Thaís Araújo para protagonista de sua novela das nove, a TV Globo, através de seu funcionário Manoel Carlos, parecia querer responder ao Estatuto da Igualdade Racial idealizado pelo movimento negro que não seria necessário estabelecer cotas para atrizes e atores negros; bem, parece não ter sido à toa que justamente no momento de uma decisão histórica quanto ao conteúdo do referido Estatuto, a Globo tenha lançado ao ar duas novelas com protagonistas negras, atrizes que inclusive têm uma postura racial condizente às suas trajetórias, como são Thaís Araújo e Camila Pitanga. Nas entrelinhas, previa-se uma forjada justificativa à sociedade das "desnecessárias" cotas raciais para os meios de comunicação, já que este espaço vem sendo ocupado pelo núcleo negro da Globo. Convenhamos, uma jogada de mestre; assim, evita-se o "mal maior" para a Consciência Branca do comando global, que é obedecer a lei e fazer cumprir os direitos da pessoa, da população e dos povos negros.
Pois então que nesta semana, no capítulo que foi ao ar na noite do 17 de novembro, com precisão cirúrgica o autor desenhou a cena mais representativa possível da ópera racista contra o verdadeiro protagonismo negro. A suposta protagonista da novela, a personagem de Helena, após ser retirada de seu núcleo familiar negro para transitar exclusivamente num núcleo branco e assim ser sujeita a traições e humilhações, é posta de joelhos diante de uma de suas antagonistas brancas - já que, para uma negra, não basta uma só antagonista, devendo vir elas em número de três: a amante do marido, a filha mimada e infantilizada do marido e a ex-mulher do marido. Não apenas de joelhos, deve pedir perdão de cabeça baixa; não apenas de cabeça baixa, sob o olhar duro e inflexível de sua então dominadora; não apenas isso, como se já não fosse o bastante, deve pedir perdão e ter por resposta uma bofetada no rosto. Para finalizar a cena, a personagem desabafa com uma das melhores amigas que "devia ser assim".
A idéia de protagonista negra, na Globo, enfim foi definida claramente. Uma heroína que, se inicialmente surgia diante de um drama familiar, afirmando um núcleo negro protagonista, como âncora, marco e raiz, veio sendo reduzida dramaturgicamente a pobre vítima de suas três antagonistas brancas, tendo estas enfim recebido mais espaço de visibilidade que a suposta protagonista. O papel, de central, tornou-se periférico, apoio para a virada de jogo das outras atrizes, que passam a receber os aplausos da população e das "críticas" noveleiras de plantão, prontas para limar a atriz negra por seu papel "sem graça".
Ou talvez, pensa o autor que pode salvar o papel de Helena pondo-a no lugar em que acha pertencer à mulher negra. Agora sim, a Globo assinou embaixo de suas verdadeiras posturas ideológicas - mais diretamente, de seu racismo.

Rebeca Oliveira Duarte
Advogada e Cientista Política do Observatório Negro

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